Laécio Lima

Laécio Lima

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Cidade/EstadoPiritiba / BA
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Passo-Preto. O Jegue... (Cordel)

Composição: Laécio Beethoven.
Passo-Preto (O Jegue Treiteiro e Afinado) Laécio Beethoven Meu estimado leitor Veja esse caso passado Com Zeca de Pedro de Elias Neste sertão maltratado Onde palma pra comer Não tinha pra dar ao gado. Muita gente conta o caso Repete no mei-da-feira: Zeca dormia no chão Só forrado com esteira Duas rês era seu gado: A Encantada e a Leiteira. Ele não lia de nada Como conta Piritiba Mas calculava tarefa Sem precisar de escriba Se notava a habilidade Do véio cortando maniva. Labutava o dia inteiro E, de noite, pra dormir Só tinha um rancho apertado De paia de licuri Queimava bosta de boi Pros mosquitos repelir. Era um bom pai de famia E pra poder atestar Criou nove bacuris E mais quisesse chegar Mas o seu maior tesouro Agora vou revelar: Zeca criava um jumento De Passo-Preto, se trata Encabrestado em sedém Sela da mão de Zé-Prata Mas quando o jegue cismava Enveredava na mata. Era um bichinho treiteiro Bom de carga e bom de trote Mas não querendo ser pego, Se laçavam seu cangote, Corria horas sem rumo Peidando em escala e mote. E na verdade eu lhe conto: Além desse quiprocó, O maior feito do asno Vinha do seu fiofó Soltava peido afinado Na escala de sol maior. E quando se precisava Transportar mourão de aceiro Quarenta estacas no lombo Pra Zeca ganhar dinheiro O treiteiro jegue escuro Carregava bem faceiro. Certa vez na Baixa-Seca Ao descer uma ladeira Tião voou da cangalha, Espatifou na poeira Arranhou o céu da boca Destroncou a sobrancelha. Correu, doido, oito léguas Por dentro do gravatá Com mandioca na carga Socada e sem arrochar Fez tão veloz uma curva Que cagou no caçuá. E com feito tão incrível Seu Zeca foi obrigado A pear o Passo-Preto Deixando bem encangado Num pasto de murundu Com cinco arame farpado. Um peão desavisado Certo dia lá passou E, com preguiça de andar, Logo se entusiasmou: - Vou montar nesse pretinho E um plano arquitetou. Colheu um naco de aipim Cortou cipó de macaco Escondeu numa coivara Sua cabaça e o saco Pulou no lombo do jegue Grudou que nem carrapato. Passo-Preto aquietou Pois tramava uma arapuca Sacudiu suas orêia Tangeu os bichos da nuca Acho que o peão mexeu No cão foi com vara curta. Se embirou com cipó Soltou sorriso bonito Pense aí meu leitor No zóio dum muar aflito Urrou e zarpou a mil Êta furdunço esquisito! Mergulhou no calumbi No espinheiro, seu moço Lapou o peão no meio Fez um rasgo no pescoço, Onde termina a coluna, No fim do intestino grosso. O homem, desesperado, Rezou um terço e chorou O jumento bem treinado No som do peido ecoou Os óio do podre coitado Saltou da terra e voltou. O jegue cobriu num pulo Vinte moita de cinzá E a mais de cinco léguas O povo escutava o ah!... O coração e o intestino Foram pro mesmo lugar. O jegue já tava em pelo Pulando em tanta lonjura Que a calça sumiu na mata A cueca, inda procura Onde antes era o saco Tinha um metro de assadura! Ficou três dias pulando Daí resolveu parar O peão ergueu a vista Pra mode se orientar As placas da variante Apontavam o Ceará! Estatelou pelo chão Por demais arrependido Não sentiu suas orêia O nariz virou ouvido Trinta ossos se quebraram O pinto tinha sumido. Faltava um dedo mindinho E via c'um olho só O joelho retorceu E seus braços deram um nó Difícil de distinguir Antebraço e mocotó. O corpo todo moído Que nem um coco ralado Fez força pra defecar O boréu tava tapado Um toco, numa das quedas, Entrou e ficou quebrado. Tentou voltar para casa Buscando o sol como prumo Querendo ficar curado Pegou mastruz e fez sumo Encontrou atrás dum dente Antiga lasca de fumo. Por muito mais de semana Zanzou pelo Ceará Caronou num caçambeiro Que viajava pra cá Pra comprar jaca e banana Lá em Tapiramutá. Depois andou mais dez léguas Pra onde tinha habitado Jurou a São Benedito Pra frente ser comportado Sem saber que Passo-Preto No pasto tinha chegado. O peão não quis saber De mexer mais no alheio Desliga o rádio de pilha Quando o assunto é rodeio Mas Zeca de Pedro de Elias, Quando escuta, fica cheio. Se sabe qu'é pra tocar Beiço de jegue atrapaia Mas não é por essa boca Que o maestro ensaia É por outra embocadura Onde o trombone não faia. E é por isso que o povo Vive hoje a solfejar As canções de Passo-Preto E se, acaso, duvidar Pergunte a quem viu de tudo, Nosso Tôi do Ceará. Depois do caso passado Percorreu todo o sertão Depois voltou para casa Sem sofrer um arranhão. O jegue se aposentou Ganhando mais que o peão. E quem não crê nos seus feitos Levando o caso na farra Quando vai pagar pra ver, Ao montar, no chão se esbarra. Soube que o jegue afinado Já regeu até fanfarra. Como nada é para sempre Dizem que um roceiro atento Viu quando o jegue correu Voou e sumiu no vento. É corneteiro, no Céu: Aumento mas não invento! Zeca vendeu Encantada, Retalhou toda a farinha Desmanchou o rancho véio Chamou a esposa Vaninha. Hoje vivem de lembrança Lá pras bandas da Baixinha! O povo sem precisão, A lenda do bicho atocha. Onde tiver multidão, Parede, pincel e brocha, Bagunça e confusão, É o jegue tocando arrocha.

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